Postagens

Mostrando postagens de abril, 2023

Indiferença

Imagem
Odiar é dar tanta relevância quanto amar, mas esquecer alguém, prezados... É caminhar sobre um cadáver, com um sorriso indiferente no rosto.

Sobre amor e potes de mostarda

Imagem
"Você deixou o pote de mostarda de ponta-cabeça", disse ele. _ Não, querido. O pote foi concebido dessa forma para que a gravidade mantenha o conteúdo sempre junto ao bico, para evitar desperdício e facilitar que a mostarda saia do pote sem aqueles estourinhos que respingam em nossas roupas. Desenhei? _ Querida, tenho TOC. Olhar para esse pote em cima da mesa como se estivesse de cabeça para baixo está me dando gastura. _Amore mio, tente enxergar esse pote como se fosse um recipiente de mostarda, não uma obra de arte fora de contexto. Menos, né? _Benzinho, então coloque este pote longe da minha visão e não se fala mais nisso. _Coração, como vou esconder de sua visão esse pote, em uma mesa para duas pessoas? Quer que eu coloque embaixo dela? - ela respondeu arfando, com um sorriso impaciente. _Não seja sarcástica comigo,  amor. Lembra o que aquele psiquiatra do filme de comédia que assistimos ontem disse para o paciente? "O sarcasmo é o primo feio da raiva". Relaxa! ...

Hirsuto fetiche

Imagem
Hirsuto fetiche Enquanto acariciava com esmero aqueles cabelos emaranhados, de fios multicores, de variadas texturas, primando que cada afago não deixasse dúvidas sobre a honestidade de seus sentimentos, lamentava quanto tempo de vida havia sido desperdiçado sem que a candura de seu afeto tivesse sido externada, fosse com gestos, palavras ou atitudes. Os dedos grossos e nodosos se revezavam com as costas das mãos rugosas na primazia de acarinhar aqueles fios, enquanto os olhos de pesadas pálpebras continuavam cerrados, deixando a inspiração do tato suplantar a visão, trazendo à sua mente a supremacia da idealização sobre a obviedade da percepção. Nas profundezas oníricas de seu córtex, todo um romance de agruras superadas com a intensidade de um amor real, posto que imaginado, era rememorado como um filme em que o roteiro era ficção, o enredo, não. Passos rápidos e ritmados vindos do corredor tornaram os devaneios em apreensão. Puxou com energia aquele tufo de cabelos da escova da patr...

Sobre um trevo renascido

Imagem
Em uma incursão ao meu quintal, perdi a tira de meia-calça que prendia minhas madeixas, mas em compensação, percebi que o trevo de quatro folhas que eu considerava morto, havia renascido.  Deve ser a natureza dizendo que enquanto houver vida, haverá esperança. Ou que quando não houver pedaços de meia-calça para prender os cabelos, haverá sempre um trevo de quatro folhas para te distrair do aborrecimento. Ou então deve ser a minha mania besta de impregnar significado em tudo que vejo, vai saber?

Heathcliff Ressurreto

Imagem
Rearranjando pela enésima vez minha biblioteca, um objeto caído de um exemplar de "O morro dos ventos uivantes" despertou-me a reflexão de que no final das contas, o que importa não é o que se vê, mas o que se percebe, insinua, desvela, instiga, provoca, desperta, reconhece, transcende, emana, inspira e sobrevive impávido, mesmo após após saciado. Explico: Quando você abre um livro e se depara com uma velha embalagem de bombom cuidadosamente trançada em laço, o que vai invadir suas memórias? O chocolate saboreado, mastigado e deglutido ou a vivência que impregnou de sentido aquele reles e subestimado pedaço de papel? Com a devida vênia a todos os chocolates que comi e a todas as almas bem (ou mal) intencionadas que os me presentearam, nenhum deles foi tão delicioso quanto aquele que outrora fora envolvido no invólucro rosa transparente, decorado com partituras e um casal bailando, esmaecido pelo solvente do tempo. Por um capricho do destino ou intencionalidade há muito esquec...

Hipocrisia

Imagem
Cobrarei tudo de ti e mesmo que tudo me deres, acharei-me no direito de te dar o oposto do que quero para mim. Todo(a) hipócrita é assim. Errei, mas a culpa de meu erro é sua, pois por mais que eu faça o que quero e tu também faças o que quero, o tudo que espero de ti e que não podes me dar será motivo para minha eterna insatisfação. Todo(a) hipócrita é assim. Se falhei, e meu erro é pior do que o seu, de nada interessa a proporcionalidade: Estarei isento do crivo de sua crítica (e de minha autocrítica), pois meu erro é humano e o seu, mero pretexto para que eu legitime o que faço de errado. Todo(a) hipócrita é assim. A dor que me causas por saber de minha inconsequência não será aliviada pelo sofrimento que te causo, mas fazê-lo sofrer me trará a satisfação de não estar sozinho ao tragar toda a possibilidade de felicidade para o desespero de meu vazio interior. Todo(a) hipócrita é assim. E você, como é?

Assaz fortuito

Imagem
Assaz fortuito  Era a primeira alvorada depois do inverno enregelante das plagas mantiqueireanas, mas o tímido sol era apenas um halo oculto pela grossa neblina característica da época, dando ares de madrugada à manhã que enfrentava o breu. Na falta de transeuntes a quem cumprimentar, ou conhecidos com quem compartilhar as sacais impressões sobre o clima, ou se inteirar sobre o último adultério do prefeito, ou quem sabe receber algum pedido de empréstimo dos fodidos que nos rodeiam, desta vez era somente o ar gélido que o acompanhava, com tal cumplicidade que o vento soprava no rumo de seu destino, onde certamente essa quase solidão daria vez a madrugadores defendendo seus lugares na concorrida fila do pão. Uma recorrente tontura o incomodava e desta vez um pouco mais que o normal, pois sob aquele espesso nevoeiro, divisar caminho entre pedras, buracos e ressaltos no meio-fio começava a dar ares de aventura àquele corriqueiro deslocamento. O pior veio a acontecer. O desequilíbrio, ...

Mente e coração (e) comprimidos

Imagem
Mais um dia perambulando pelas ruas imaginárias das emoções anestesiadas e enquanto divago, tropeço num tarugo de entusiasmo que não deveria estar ali. Mas que raios estaria aquele impulso anímico fazendo na segurança do meu torpor? Seria reação à ausência das vivências que outrora preenchiam meus olhos com belezas, para depois furar minhas córneas com a estéril certeza das lacunas que se sucederiam em verdadeiros saaras de arenosas nulidades? Ou a necessidade de se mostrar à miríade de individualidades que residem no atro infinito, tal como imã que pinçasse dos amplos espaços vazios as filigranas de essencialidades esparsas que estivessem eternamente à espera de serem notadas, para então, reconhecerem-se em si? Quem sabe tivesse sido um par de borboletas tingidas em psicodélicos gradientes, que em singela e improvável manobra, tapassem meus ouvidos e impedissem que eu ouvisse mais uma vez que a mediocridade é a norma e que não sentir nada é mais seguro que ter as sinapses explodidas p...