Hirsuto fetiche
Hirsuto fetiche
Enquanto acariciava com esmero aqueles cabelos emaranhados, de fios multicores, de variadas texturas, primando que cada afago não deixasse dúvidas sobre a honestidade de seus sentimentos, lamentava quanto tempo de vida havia sido desperdiçado sem que a candura de seu afeto tivesse sido externada, fosse com gestos, palavras ou atitudes.
Os dedos grossos e nodosos se revezavam com as costas das mãos rugosas na primazia de acarinhar aqueles fios, enquanto os olhos de pesadas pálpebras continuavam cerrados, deixando a inspiração do tato suplantar a visão, trazendo à sua mente a supremacia da idealização sobre a obviedade da percepção.
Nas profundezas oníricas de seu córtex, todo um romance de agruras superadas com a intensidade de um amor real, posto que imaginado, era rememorado como um filme em que o roteiro era ficção, o enredo, não.
Passos rápidos e ritmados vindos do corredor tornaram os devaneios em apreensão.
Puxou com energia aquele tufo de cabelos da escova da patroa, jogou-o prontamente na lixeira e deu continuidade a seus afazeres de empregado, não sem antes guardar num dos bolsos do macacão alguns fios remanescentes, que lhe garantiram no porvir, fantasiar de novo seu fetiche tão premente, quanto irrealizável.
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