Crepúsculo
O crepúsculo se avizinhava, o sol fenecia em gradientes pastéis, os esparsos cirros riscavam de branco o que restava de azul no firmamento, o cálido mormaço cedia vez à aragem fresca que aguardava o escurecer para tornar-se gélida e fustigar os incautos que ignoravam que a lua crescente traria dali a pouco, a primeira noite de inverno.
Alheio ao clima, à estação do ano, ao livro que trouxera e não lera e ao fluxo dos transeuntes rumo ao portão do parque que fecharia dali a pouco, acomodou-se no banco de madeira e passou a observar o frondoso suinã que interpunha-se entre ele e o sol poente.
O carmim salpicava toda a copa, variando entre botões assemelhados a feixes de pimentas e flores desbragadamente desabrochadas, projetando rubros pistilos, brincando com os olhos, quais falenas bailarinas.
As folhas, em contraste à pirotecnia voluptuosa das inflorescências, como que resignadas coadjuvantes, precipitavam em lotes, amarelecidas, rodopiando e tecendo erráticas trajetórias até pousarem inertes, competindo com a grama a primazia sobre o solo.
Um lapso de estupefaciência assaltou-lhe os sentidos. E transitando entre o assombro, o estranhamento e a admiração, viu-se cativo da contemplação, naturalizando os ciclos da vida, buscando na consciência sobre os processos da existência, o pertencimento a um todo interconectado.
Um silvo o abduziu de suas reflexões. Tornou os olhos na direção do som e um guarda gesticulava, num convite compulsório ao alheamento definitivo de sua vontade, que era ali permanecer.
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